quarta-feira, 19 de maio de 2010

A Viagem

"Mágica Maresia"

A noite fazia-se adivinhar, quando o crepúsculo descia, e pelo desenhado das nuvens cinzentas, que lentamente, iam manchando o céu e apagando o sol, no seu declínio.
-Ufa. Já não vejo a estrada! Vamos parar trinta minutos na próxima estação de serviço, para eu passar pelo sono e depois seguiremos viagem: -. Disse o pai da Sara depois de soltar um longo bocejo.
A Sara dormitava no banco traseiro, enquanto a mãe lhe aconchegava, um casaco fofo, por cima do corpo e a ela se aninhava, para também dormir um pouco.
A Sara acordou e entrou num bosque. Foi andando... Andando! E sem sombra de medo, foi-se envolvendo na paisagem, olhando para tudo o que a rodeava em busca dos pais que deviam estar ali por perto. Viu o verde dos prados, onde serpenteavam as hortas fresquinhas e arvores fruteiras, que confinavam numa eira, de trigo loiro sorridente, de onde espreitava o vermelho das papoilas suas companheiras. Por entre a folhagem, os passarinhos chilreavam, à sua passagem rendiam-se em homenagem, afinando as suas melodias. Nos ramos arrulhavam pombos, cantavam as cotovias e as cigarras faziam coro. Correu o coelhinho branco sarapintado de cinzento, que se sentou sobre as patas traseiras roendo uma cenoura. Mas não foi por muito tempo. Por ter visto a raposa de olhos dourados e pêlo de cor ardente, que vinha na sua peugada. A finória, pôs os olhos em cima da menina, afilou, ainda mais o focinho, e fugiu desconfiada! O sorriso da Sara iluminou-se ao recordar estas imagens nos filmes animados – É da cor da” Lassie” do tio Tiago! – Se calhar, ainda vou ver a pantera cor – de – rosa: - Disse a Sara, e ficou à espera.
Sentou-se numa pedra esburacada de onde brotavam fetos verdinhos, sustentados pelo olho de água que se desfazia em cascata, nascida no alto do rochedo (pedra). Esta docemente ia morrendo no ribeiro de pedra solta e finava num lago onde nadavam alguns peixinhos. Inebriada pela natureza, deitou um olhar no caminho formado por arvores, que se aliavam no seu topo, e viu ao fundo uma luz enevoada.
Seguiu esse trilho e avistou, um senhor já velhinho e de olhar bondoso. Arrastando-se no seu cajado. -Deve ser muito pobre! – Reparou, olhando para os seus pés descalços e as pobres roupas que trajava.
- A menina anda perdida por aqui?! – Perguntou o senhor.
- Não! Ando a ver, se vejo os meus pais: - Respondeu a Sara, mirando o velhinho alto a baixo.
- Os teus pais virão, sim! Mais tarde... - Disse o senhor, passando-lhe a mão pelo cabelo.
A menina, não fez mais perguntas. Mas, ficou a meditar...
Como é que ele sabia, o tempo que iriam demorar?!
Encolheu os ombros e franziu a pequena boca, emocionada, engoliu a seco. O que a impediu de chorar!
- Tens fome? – Perguntou-lhe, o senhor.
- Sim...tenho alguma..: - Respondeu a Sara pausadamente.
Este estendeu um braço e colheu um cacho de uvas.
-“ Come estas uvas e estarás sempre comigo, mesmo que, não estejas presente. Eu estarei sempre contigo, até em pensamento!”:
- Disse o senhor com um sorriso doce.
A Sara hesitou, por lhe ter vindo à lembrança, as recomendações feitas pela mãe, de nunca aceitar nada, dado por ninguém. Contudo, este estranho era diferente. Até parecia que já o conhecia há muito tempo. E comeu as uvas desalmadamente.
O senhor, ao ver a menina, a comer com tanto apetite, convidou-a para cear com ele. Estendeu-lhe a mão, que esta apertou com muita força e dirigiram-se a sua casa que ficava naquela imediação.
A casa era feita de pedras, e coberta de troncos de árvores, e folhas de palmeira e a fazer sombra uma amendoeira. Entrou e viu uma mesa tosca, e alguns bancos e ao fundo um forno, onde cozia o pão.
A Sara sentou-se olhando para todos os lados com curiosidade de criança.
Como se chama o senhor? - Perguntou a Sara
Podes chamar-me Senhor, se quiseres – disse o Senhor
Esta casa é tão pequenina... O Senhor mora aqui sozinho? – Perguntou a Sara.
Sim, moro sozinho! Mas tenho grandes amigos que são visitas da casa. Não tarda muito tempo, estão aí a chegar: - Respondeu o Senhor enquanto dispunha sobre a mesa, um cesto de pão, e algumas malgas, e uma panela de caldo que fumegava!
De repente ouve-se um grande alvoroço. E pela porta dentro, entram uma dúzia de crianças, correndo, irrequietas e sorridentes. Que em volta do Senhor se juntaram. Esperando pelo que este teria para lhes dizer.
-Temos uma visita, que veio cear connosco! Hoje teremos mais uma malga na mesa para a nossa visita que está só de passagem. Anunciou o Senhor.
- OH...!: - Disseram em coro, algo desiludidos por a sua nova amiguinha estar de partida.
Naquele momento, sentaram-se à mesa. Agradeceram a refeição ao Pai. Comeram o pão e o caldo, que a terra lhes deu.
A Sara, no fim da visita, foi agraciada com uma grinalda de flores, que o Senhor colocou na sua cabeça. Para que, pela vida fora, se lembrasse do desvio que fez na viagem.

A madrugada estava desperta. O carro parou, retrocedeu a chave na ignição. O motor ficou em silêncio. Desligou os faróis Desapertou o cinto de segurança
-Chegamos finalmente. Disse o pai da Sara enquanto abria a porta para sair.
A Sara deu um salto. E com os olhos esbugalhados, levou as mãos à cabeça – E perguntou – onde estou? - Com a grinalda nas mãos!
Os pais entreolharam-se, sem encontrarem uma explicação.
A grinalda da Sara jamais morreu. Assim, como a graça que Deus lhe deu, em lhe ter aberto as portas do céu.

Raízes M/Peniche

26 comentários:

  1. António Alves19/05/10, 20:07

    O importante na transmissão das mensagens é o seu conteúdo. Este conto tem muito conteúdo e deixa ao nosso imaginário a reflexão que a nossa própria inteligência permite. Está muito bem trabalhado e conseguido. Muito ao pormenor e digno de ser classificado de muito bom.

    ResponderEliminar
  2. É sublime pensar em Cristo e na vida para além da morte. Este conto mostra esse Cristo rodeado dos seus apóstolos e pescando mais. O seu olhar de amor que nos atrai, leva-nos a escrever coisas como estas. Atrevo-me a dizer que entre o conto do mês passado e este, existe uma ligação: O amor do Pai contido no ser humano. É bom pensar neste céu e nesta vida eterna onde só podemos encontrar o pai. Grandes contadores de histórias.

    ResponderEliminar
  3. Eu adorei. Mais um conto aprimorado e penso que está em crescendo a qualidade de escrita. Bem ao nível do melhor. Este céu é a nossa meta. Sonho, amor e realidade.

    ResponderEliminar
  4. Poxa que conto tão comprido! Ainda pensei não ler...mas ficava perdendo.

    ResponderEliminar
  5. Margarida Rebelo19/05/10, 20:12

    Um texto muito bem escrito e mais uma vez se comprova que o material que entra aqui é de grande qualidade. Paulo/Raizes e Raizes/Paulo, trazem-nos do melhor. Parece até existir uma certa competição em termos de qualidade. Situação saudável e benéfica ao Blogue. Os contos têm sido excelentes.

    ResponderEliminar
  6. Margarida Rebelo19/05/10, 20:12

    Um texto muito bem escrito e mais uma vez se comprova que o material que entra aqui é de grande qualidade. Paulo/Raizes e Raizes/Paulo, trazem-nos do melhor. Parece até existir uma certa competição em termos de qualidade. Situação saudável e benéfica ao Blogue. Os contos têm sido excelentes.

    ResponderEliminar
  7. Á melheres que conto tão grande mas tão benite. Gostei!

    ResponderEliminar
  8. Eu gostei tá muito benite tá! tá!

    ResponderEliminar
  9. Sofia Melo19/05/10, 20:15

    Estes dois últimos contos trouxeram-nos um não sei que de deslumbre. Vale mesmo a pena passar por aqui. Causa de sucesso que não acontece com outros! Parabéns. No divino está a sabedoria, essa sabedoria que é mostrada nestes mimos de grandeza.

    ResponderEliminar
  10. Existem os comentadores.
    Existem os construtivos.
    Existem os parolos e as parolas!
    Valha-me a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Perante um conto desta natureza é penoso existirem certos comentários. Está muito bom. Um grande conto que não fica nada atrás dos outros e trás um crescendo de qualidade como se tem vindo a notar, conto após conto! O Cristo Ressuscitado e este trouxeram-nos ambos uma magia e perfeição única.

    ResponderEliminar
  11. Um momento de grande rigor e qualidade de escrita. Mensagem e conteúdo de primorosa força de sabedoria. Sem dúvida um trabalho muito bem pensado. Partilho da opinião anterior que mostra uma ligação ao Cristo Ressuscitado. Embora diferentes, ambos denotam um crescimento que é de louvar, uma vez que os anteriores já eram difíceis de superar. Nem sei de qual mais gostei. São momentos de leitura únicos!

    ResponderEliminar
  12. Esculástica19/05/10, 20:19

    Entristece-me que a Nazaré esteja tão mal representada nos comentários do Peniche Livre. Nem sequer gosto de comentar, mas como acho que devemos contribuir um pouco melhor perante tais trabalhos, cá vai. Numa tentativa de apagar e fazer esquecer o que as minhas conterrâneas disseram, acho o conto maravilhoso assim como tudo o que por aqui se escreve.
    Sem dúvida um bom trabalho. Também fiquei deslumbrada com o Cristo Ressuscitado e este volta de novo a deslumbrar-me. Bons trabalhos.

    ResponderEliminar
  13. Que Dizer desta viagem que nos coloca no imaginário ambicionado. Verdade? Mentira? Ou pura ilusão?! Realmente uma grande história. Jesus e os seus apóstolos no seu reino. Um cheirinho a cristão (arriscaria a dizer, não praticante) e com toque de história infantil. Uma temática ao longo das cenas que nos leva a acreditar, ou a supor que o céu é o limite, muito embora, deixando bem claro, que às crianças pertence. Uma história inteligente e muito bonita.

    ResponderEliminar
  14. Marta leni20/05/10, 21:28

    Grande e bonito.

    ResponderEliminar
  15. Um conto muito bonito.

    ResponderEliminar
  16. Ligia Martins21/05/10, 21:08

    Este conto está maravilhoso. Muito bem escrito e com uma grande qualidade. Adorei.

    ResponderEliminar
  17. Um momento alto deste Blogue. Mais um conto que nos eleva.

    ResponderEliminar
  18. Maria Augusta21/05/10, 21:14

    Estas raízes fizeram um conto muito bonito.

    ResponderEliminar
  19. Conceição Simões21/05/10, 21:16

    Está muito bonito. Em breve estarei em Peniche para as festas. Já comprei portátil novo. Não posso deixar o meu Peniche Livre e melhor ainda estando em Peniche. Vivam as férias!

    ResponderEliminar
  20. É um conto muito bonito, mas… penso que será penalizado por ser tão grande. O povo português não gosta muito de ler.

    ResponderEliminar
  21. Eu acho o conto muito bonito, mas é grande.

    ResponderEliminar
  22. Ambrosia Faustina21/05/10, 21:19

    Está muito bonito. Eu acho que tem o tamanho normal. Esta Carlota, mas que nome é esse?

    ResponderEliminar
  23. Ambrosia Faustina21/05/10, 21:20

    E Este António a chamar-nos burros!

    ResponderEliminar
  24. Adorei este conto.

    ResponderEliminar