segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A CIGARRA E A FORMIGA

"Mágica Maresia"


Já morava o sol no jardim da Primavera, dançavam as árvores ao sopro do vento. Este estava povoado de aves, que enlevados pelos seus poleiros dançantes, cantavam o seu deslumbramento.
A cigarra que deixara o seu berço de infância deitara-se a imaginar, criar amizade por entre a vizinhança.
- Com pássaros? Nem pensar! A mãe ensinou-me que eles são meus predadores. Debicavam-me, sem dó pelas minhas dores, até acabar num bom manjar – pensou a cigarra.
Precavida de algum embuste, lá foi ela em voo curto, treinando as asas, e espreitando a melhor caule de planta para deguste.
Avistou uma semente a ser rolada por uma formiga. Aproximou-se, e logo procurou fazer-se dela amiga
- Bom dia formiguinha. Posso cantar-te uma cantiguinha?! – Perguntou a cigarra.
- Claro que sim! – Exclamou a formiga – Mas... Não pedirás nada em troca, pois não?!
- Não – retorquiu a cigarra – E cantarolando, seguiu a formiga, que mais tarde, viria a perder de vista.
Mais adiante, viu outra, um pouco desajeitada, arrastando um pequeno grão.
- Bom dia formiguita. Queres ajuda e ouvir uma canção? – Disse a cigarra.
Porém esta não respondeu. Correu amedrontada por entre os arbustos, e com a comida se escondeu.
Até que avistou um carreiro delas, que recolhiam ao formigueiro, e ousou cantar para elas. Palavras de gentileza?! Qual nada, nem sombras delas! Antes pelo contrário. Usaram grande aspereza. Acusaram-na de no Verão andar na farra e nem para o seu sustento trabalhar. De no Inverno, passar o dia a pedinchar.
Ao qual esta lhes respondera: - “ cantar, fora um dom que Deus lhe dera. Se Ele as destinara para trabalhar, sem momentos de diversão. Estarão certamente a pagar, algo que fizeram de mal numa outra Encarnação”.
O formigueiro reuniu-se e tomaram-se de razões, e decidindo expulsar a pobre cigarra. Esta caiu por terra destroçada. Ora cantando, ora soluçando! Assim, passou a noite escondida naquelas proximidades.
Na manha seguinte, as formigas saíram para a labuta. Até que surgiu a formiga mais afável. Esta se lhe dirigiu dizendo: - cigarra, ainda está por estas paragens?
- Estou, e depois de uma noite mal passada que levei a meditar, interrogando-me sobre as causas, pelas quais, o formigueiro tão mal me tratar – carpiu mais uma vez a cigarra.
- Dissera-o a nossa Rainha, com todo o seu saber: Que no passado, as nossas avozinhas, evadiram a Biblioteca, leram no livro de” La Fontaine”, a história da formiga e da cigarra, e que às filhas contaram, na hora de adormecerem – Declarou a formiga
A Cigarra ficou abalada com tal revelação. Gostaria de conhecer o “La Fontaine” autor de tal confusão. Ela própria dir-lhe-ia que uma cigarra come raízes e seiva das árvores. Não come sementes nem grão – Disse a cigarra sob grande emoção.
Até que um dia, já o Verão declinara, de repente, desabara um grande temporal que nem o jardim da Primavera poupara: A água da chuva subira de nível e pusera em risco a sobrevivência da bicharada. Era grande a aflição. As formigas estavam cercadas.
A cigarra apercebera-se de tal situação, decidira agir movida de compaixão.
Esta voara até ao formigueiro e transportara-as para terra firme sobre o seu dorso.
-“ A justiça vem do divino, disfarçada de chuva” – pensou a cigarra de olhos erguidos ao céu.
Mais tarde, quando o arco-íris resplandecia, a Rainha mandou chamar a cigarra ao formigueiro, que em nome da sua comunidade, pediu perdão à cigarra. Por todo o passado de rejeição que haviam sofrido. Quando afinal estas, nada lhes haviam pedido. Doravante as formigas, sempre que se cruzam com as cigarras perguntam – Hei amigas, cantam-nos umas cantigas?



Raízes M/Peniche

"Este conto está sujeito a uma cuidada avaliação de comentários pelo autor.

Os três melhores comentários (assinados) serão publicados, com a respectiva classificação, numa das nossas colunas e ficarão expostos durante todo o mês (Setembro)".

Paulo Gonçalves

30 comentários:

  1. La fontaine? Quem diria que este conto seria tão genial.

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  2. Adorei a leitura do La Fontaine. Fantástica ideia.

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  3. A peculiaridade deste conto leva-nos a entrar num fantástico ambiente Primaveril. O encontro de animais em harmonia e amizade serve de inspiração para a paz entre os homens, sempre tão desejada e não conseguida. A vontade de ajudar o próximo é fonte de amor e paz.

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  4. Uma história genial.

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  5. António Alves18/08/10, 20:26

    Ora deixemo-nos lá de preguiças porque não podemos comentar tudo o que o Blogue coloca, teriamos que estar de folga sempre. Este conto desmistifica a cigarra de uma forma bem inteligente. Afinal o que nos parece mal nem sempre o é. Os juizos de valor pairam na mente humana. Está muito bonito e contextual.

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  6. Faço minhas as palavras do António.

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  7. Margarida Rebelo18/08/10, 20:32

    Temos um conto que muda a figura central e histórica da triste Cigarra. É que leva sempre por tabela só porque gosta de cantar. Está muito bonito e digno de ser lido. Que trabalheira que resultou num belíssimo e aprimorado conto.

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  8. Sofia Melo18/08/10, 23:28

    Tenho gratos momentos neste Blogue. Eis mais um. Uma fabulosa história que trás muita humanidade e aprendizagem de vida. A solidariedade e o divino interligam-se aqui. Aquela cigarra que olha para o céu e entende a chuva como meio de lavagem de imagem está soberbo!.
    Que lindo Jardim de Primavera.

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  9. Que grande volta que esta história levou.
    Está genial.

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  10. um conto belissimo.

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  11. Quando o Inverno chegou, a Cigarra não tinha nada para comer. No entanto, viu que as Formigas tinham muita comida porque a tinham guardado no Verão. Distribuíam-na diariamente entre si e não tinham fome como ela. A Cigarra compreendeu que tinha feito mal...

    Moral da história:
    Não penses só em divertir-te. Trabalha e pensa no futuro.
    Nesta história aconteceu um volt face. Parabéns pela magnifica imaginação.

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  12. Um conto maravilhoso.

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  13. Carlos Miranda19/08/10, 17:51

    Tenho pensado várias vezes em como nem sempre conseguimos ler coisas tão boas mesmo de autores consagrados. Por isso os lugares cimeiros no top mesmo à frente de grandes poetas. Prestigiante é estar aqui e ler o que aqui se passa.

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  14. Conceição Simões19/08/10, 17:56

    Estou de regresso de férias e deparo com coisas magnificas. Sempre nos habituamos ao que é bom.
    Este conto mostra como a ingratidão não é boa companheira. A amizade sem desprezo contempla a honestidade e justiça.

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  15. Temos aqui uma grande marca de tradicionalismo em relação à Cigarra. Está soberbo e grandioso.

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  16. Fúzia Rios20/08/10, 09:31

    Algumas cigarras aparecem a cada verão, mas quase imperceptível. O que você diz, são as cigarras periódicas?
    Eles são insetos barulhentos preta, medindo cerca de um centímetro de comprimento, com os olhos vermelhos, e realizar um dos truques mais fabuloso na natureza. E se você vive no leste dos Estados Unidos, as chances são que você está aprendendo muito mais sobre eles.
    Raízes irá decidir-lo bien! Tierno grand sabedoria.

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  17. Segundo a "Olhares"
    A Sinfonia das cigarras é apreciada pela população

    Canto das cigarras encanta os campineiros nas ruas e praças os machos iniciaram a sinfonia para atrair as fêmeas para o acasalamento, nestas primeiras semanas de Primavera.
    Começou a sinfonia das cigarras. Nas ruas e nas praças os machos estão cantando para atrair as fêmeas para o acasalamento. A maior parte das árvores tem a presença desses insetos que chegam anunciando a primavera e o período de chuva. Mas se encantam a população da área urbana com uma cantoria meio zumbido, meio coral, levam ao desespero os agricultores da área rural, por ser uma das principais pragas do café.
    O canto da cigarra é produzido por vibrações de membranas existentes em seu abdome, explica o diretor do Instituto Biológico, Antônio Batista Filho. Esses insetos aparecem a centenas nas árvores, deixando para trás a pele que trocaram quando saíram da terra na forma de ninfa para tornarem-se adultos, acasalar e morrer logo depois da postura dos ovos.
    As crianças se divertem coletando as exúvias (a pele seca) das cigarras. "É tão bonito ouvir esse canto logo cedo!" , diz a dona de casa Regina Bertazzo. O canto da cigarra, diz, a faz lembrar da infância, quando as crianças disputavam para ver quem conseguia coletar mais "cascas" do inseto.
    Quanto mais arborizada uma rua ou praça, maior é a sinfonia. É o caso, por exemplo, do Largo Santa Cruz, no Cambui. O taxista Ademar Barreto conta que nesse período do ano, a cantoria começa logo cedo na praça. "É bonito ver esses insetos saindo da casca", afirma.
    Com estas histórias aprendemos um pouco mais sobre o que nos rodeia e até sobre sentimentos humanos.

    Esta história contém a genialidade de mudar e alterar um conteúdo que após anos se mantém como imagem de marca. Mudando a imagem da pobre Cigarra verificamos que também ela tem a sua função para além de cantar que lhe é facultada pela natureza não tendo por isso que ser penalizada. Por outro lado o canto e a diversão não invalidam a poupança, mesmo porquê; a Cigarra alimenta-se de forma diferente das formigas. Muito bem construído, este conto é uma dádiva! PARABÉNS!

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  18. Miguel Borges20/08/10, 14:36

    Grande e enaltecedor conto. As cigarras são um bicho muito marcado, tal como os amigos de Peniche.

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  19. Esculástica20/08/10, 14:38

    Acabaram as férias. De volta à Net. o blogue tem vindo a ganhar. Em vários lados ouvi falar dele. O mês de Julho foi puramente extraordinário, completando-se, o Verão, com histórias magnificas como esta.

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  20. Esculástica20/08/10, 14:39

    Para bem de todos acabaram-se os anónimos sem conteúdo.

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  21. O Blogue cada vez melhor, as Raízes cada vez melhores.Setembro é mês de mudança, tal como acontece todos os anos. vai ser mais um passo para o crescimento. Não tenho dúvidas, tal como conheço as capacidades do Paulo.

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  22. José Carlos20/08/10, 17:52

    Os melhores Blogues têm várias pessoas a trabalhar para eles. Neste caso supera-se com as Raízes e o Paulo. Com poemas e contos destes este é um Blogue de ouro.

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  23. Gostei, particularmente da narrativa. Uma descrição perfeita dos locais, sentimentos, acontecimentos e pormenores. Um quadro com todas as peças e perfeitamente encaixadas de forma a delinearem a magia da história.

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  24. Marta Leni20/08/10, 18:00

    Um brilho muito especial é o que nos trazem as Raízes que oferecem mais cor ao, já de si, colorido e brilhante Blogue. Ao ver os comentários não pude deixar de dar, também o meu contributo, não porque queira ser classificada mas porque acho que são merecedoras dos melhores comentários. Congratulo-me com a ideia das classificações pois por meio dela desapareceram os comentários estúpidos que em nada diginificavam o Blogue e demonstravam uma inveja sem precedentes.

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  25. De facto começa, agora, o Blogue a colher os frutos pelo facto de ter banido as ervas daninhas.
    Mais valem quatro ou cinco comentários honestos e construtivos do que dezenas de destrutivo. A seu tempo o Blogue vai crescendo. Também, era impossivel não crescer, com gente desta a trabalhar desta maneira.Quanto ao conto; está simplesmente perfeito. Melhor é impossivel!

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  26. Grande Raízes!

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  27. Raizes escrevem bem mas fazem tão pouco!

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  28. Henrique Mendes14/05/13, 19:27

    Dá saudades ver por aqui estas raízes. Belo trabalho.

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